sem ombros

A soberba prepotência de minha alma me fez perceber que eu queria ser livre de mim mesma. Contudo, como é difícil desprender-me! Eu observo a dor e ainda agora me faltam alguns azuis ou um céu ensolarado. Quando tudo nos escapa das mãos, quanto tempo mais demoramos para perceber que na verdade nunca tivemos  algo? Não fomos feitos para o peso de nossas cargas.
A vida é forte, uma força que evidencia ainda mais nossa fraqueza. Como preguiçosos, somos guiados pelo querer, e indispostos ao desprazer das coisas. Nada nos veste, como roupas molhadas em dias de chuva, no ônibus abafado. Nos fazemos companheiros da tristeza e de repente: só o coração bate. A vida está às escuras. Dizer-me que já não quer abrir a porta é escuridão. E de fraqueza em fraqueza vai dormindo...
Sem sua plenitude, a vida é só mistificação.

Rabisco de sonho

Um pincel te colore
 Nas cores do céu
Em existir o sempre.

Tu existes para além daqui
E de longe te avisto
Em despedidas de contido
ensaio de não-dizer.

Por teus olhos
Clarões de vida
Me atravessam
E passos me conduzem
A descansar em teu encanto,
Refúgio de ser.

Pequenos versos
A minha alma te dedica
De sempre em vez.

Da memória em uma cor

Pintei-te em azul -
Sobre os sopros do teu ofício -
Uma brisa afasta a cortina
E no espaço da janela
Avisto teu sorriso.

Quando és todo presença
Demoro minha vida
Perene guarida
De um céu sem nuvens.

Sobre os presentes espalhados
Sorri-me um então, amigo
Doce sussurro de Deus,
Dos sonhos, vivido
A linha azul da indizivel
Feitura na qual se debruça
O nosso tapeceiro.