Mesa para dois

Janta comigo essa noite e desfaz no tempo a conta das horas
Como se fora do mundo estivéssemos sentados
À ponta da lua ou no embalo das estrelas, senhoras do tempo.

Conversa comigo baixinho
Como fosse possível descobrirmo-nos tão pequenos,
Fora do espaço olhar o homem e a formiga num momento.

Escreve comigo os versos incompletos dessa noite,
Como se cartas dedicássemos a desconhecidos 
Esquecendo o lápis no meio de um riso, uma lembrança, um sonho.

Senta comigo essa noite e lê meu livro favorito,
Conta meus versos de trás para a frente.
Como me navegasse, águas tranquilas -- e te desenho,
para erguer nesses versos últimos algo não visto ou dito por ninguém senão por mim,
você, quadro na parede da minha jornada,
imagem que habita minha memória,
a quem as palavras parecem investigar, sereno.

Me dê a mão no fim da noite e descansa em mim
Como fosse o tédio, a alegria, o cansaço, a monotonia
Todos dádivas.
E agradeço 
Como acordasse todo dia às 6h bem-humorada
porque te vejo aqui, sentado comigo, numa mesa para dois em qualquer canto do mundo.